Empregos “verdes” com direitos e salários justos!

Artigo de Igor Iordanov, um trabalhador da CP

Dia 27 de Maio os ferroviários realizarão uma greve de 24 horas convocada pelo Sindicato Nacional dos Trabalhadores do Sector Ferroviário (SNTSF-CGTP) nos Comboios de Portugal – CP e na Infraestruturas de Portugal – IP. Reivindicam a actualização dos salários que na CP não acontece desde 2009, que se cumpram os Acordos Colectivos na IP, e melhores condições de trabalho. Há um protesto às 10h30 frente ao Ministério das Infraestruturas e da Habitação na Avenida Barbosa du Bocage, junto ao Campo Pequeno, e às 9h30 frente à estação de São Bento no Porto.

O panorama na ferrovia em Portugal mudou. O Governo inverteu a tendência de desinvestimento do sector, reabriu linhas, oficinas, comprou mais comboios e reabilitou outros. Muito mais está planeado, e quase não há mês que passe sem inauguração com o Ministro das Infraestruturas e da Habitação, Pedro Nuno Santos e outros membros do Governo. Mas nós ferroviários continuamos apenas a ver passar ministros, e ver passar comboios. Os planos do Governo são ambiciosos, mais de 2 mil milhões de euros de investimentos em curso no âmbito do Ferrovia 2020, e 10 mil milhões na ferrovia no Programa Nacional de Investimentos 2030. Não sobrará qualquer coisinha para quem literalmente põe os comboios a mexer todos os dias?

Muito se fala que os comboios são o futuro, e que este e todos os transportes de corrente contínua são a alternativa ao automóvel e ao avião necessária para travar as alterações climáticas. Mas isso requer empregos qualificados com direitos e salários justos que fixem as pessoas. O movimento contra as alterações climáticas tem vindo a reinvidicar e bem o investimento na ferrovia, e uma transição justa para os trabalhadores para sectores sem emisssões de CO2. No Relatório “Empregos Pelo Clima”, calcula-se que seriam necessários mais 15 mil trabalhadores no sector.

Nas negociações do novo Regulamento de Carreiras o Governo não se compromete com uma actualização salarial. Ao contrário do que a Direita e os órgãos de comunicação social que controla sempre propagandeiam, os ferroviários que trabalham no sector público ganham mal. Nós nas oficinas da CP (ex-EMEF), por exemplo, não trabalhamos 35 horas nem temos ADSE. Recebemos um subsídio de escala para trabalhar noites, fins de semana e feriados de… 65€. O salário bruto de entrada de um operário são 799€, e o topo de carreira 1025€, que é o caso de muitos operários alguns com 40 anos na CP. Há dificuldade em contratar para as oficinas, e as recentes mudanças só têm feito com que os novos trabalhadores não durem muito. Fundiram as funções de electricista e mecânico numa “super-categoria”, e pretendem acrescentar tarefas de manutenção e condução aos manobradores mas com os mesmo salários ou com ridículos aumentos. É a polivalência (dos outros) que as “cabeças pensantes” pensam tudo resolver. Mas a EMEF passou anos a ver os passageiros a aumentar, os trabalhadores a reformarem-se, mas sem contratar. Hoje já existe um “fosso geracional” que torna difícil a passagem de conhecimento e a formação de trabalhadores experientes. A cultura de que toda a gente faz tudo, de gestão industrial “just in time” com poucos stocks e pouco pessoal, não nos prejudica só a nós, mas também a qualidade do serviço.

Os ferroviários têm uma tradição operária de sacrifício e coragem. Mas uma coisa é ter orgulho em ser ferroviário, outra coisa é gostar de trabalhar cada vez mais por cada vez menos dinheiro. Querem nos encher os olhos com inaugurações e promessas, mas nós não pagamos as contas com orgulho nem com comboios novos.

Nos últimos dias, depois de anunciada a greve do sindicato da CGTP, já houve uma greve convocada e desconvocada pelo SINFB, e uma outra greve convocada para dia 02/06 por 8 Sindicatos (ASCEF, FENTCOP, SINDEFER, SINFA, SINFB, SIOFA, SNAQ e STF), que dizem desconvocar se o governo avançar com uma proposta de aumento até dia 28/05. Alguns dizem apoiar a greve de 27/05, apesar de “não terem sido convidados”. Existe muita confusão e divisão no sector que tem que ser superada. Pouco importa saber quem convidou ou deixou de convidar, se isso é feito nos gabinetes ou por e-mail entre dirigentes. A CP e a IP têm uma comissão de trabalhadores e várias sub-comissões a funcionar em todo o país. Elas podem e devem ser espaços de debate entre todos, quanto mais não seja para que todos percebamos quais são afinal as divergências entre os diferentes sindicatos. Com acções unificadas entre pessoal da manutenção, bilheteiras, revisores, administrativos, manobradores, maquinistas e todos os trabalhadores, teremos mais força. Mas a unidade não se constrói só com apelos, “dá trabalho”.

Lá estaremos hoje na luta. E esperamos que os camaradas gravemente feridos no recente acidente nas oficinas do Entroncamento recuperem, bem como que o Governo e a CP dêem tanta importância a esse caso como dão às inaugurações, que sejam apuradas as causas do acidente, e que o Governo cumpra com as suas recomendações dos relatórios, ao contrário do que fez no caso das máquinas de manutenção de catenárias na IP.

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