DesVentura em Setúbal: o que realmente aconteceu?

Ontem, 21 de janeiro, André Ventura fez campanha em Setúbal. Nesta cidade, como em tantas outras, foi recebido com protestos: centenas de pessoas concentraram-se em frente ao Cinema Charlot para denunciar a sua política do ódio. A meio da tarde, vários canais televisivos fizeram um direto, anunciando que o candidato do Chega havia sido apedrejado. Foram mostradas imagens dos manifestantes, de uma forte carga policial, de um operador de câmara ferido na canela… mas ninguém captou qualquer arremesso de pedras. No respetivo direto, a jornalista da RTP3 confirma que foram arremessados contra Ventura pequenos objetos mas nenhuma pedra. Testemunhas confirmam que isqueiros e pastilhas foram arremessados, ainda que não se saiba por quem. A versão da pedra aparece “confirmada” por imagens da TVI, que filmam uma pedra da calçada… no chão, onde é comum encontra-las. Há fotografias, da própria ChegaTV, que dão a entender que a pedra filmada pela TVI já lá estava antes de Ventura sequer sair da ação de campanha.

Perante os protestos de dias anteriores, Ventura já ensaiara o discurso da vitimização. Já antes falsificara assinaturas, na legalização do seu partido, ou apoios, no triste episódio de um apoiante cigano que afinal não o era. Ventura sabia igualmente que Setúbal é uma cidade onde encontraria contestação, decidiu porém fazer nesta cidade uma das suas últimas ações de campanha. É possível que tudo se tenha tratado de mais uma encenação de Ventura? E qual foi o papel da PSP neste evento? A verdade é que, após a versão de “chuva de pedras” veiculada pelo comandante da PSP, a Comunicação Social fala de uma só pedra. Manifestantes no local asseguram que foi a PSP quem feriu o operador de câmara na canela – poderia uma pedra alegadamente apontada a Ventura ferir alguém na canela?

Reproduzimos abaixo o testemunho elucidativo de José Abrantes, membro do Semear o Futuro, presente na manifestação de Setúbal:

“Escrevo este pequeno testemunho como forma de esclarecimento quanto ao que tem sido veiculado pela generalidade da Comunicação Social, relativamente à manifestação contra a vinda de André Ventura a Setúbal. A manifestação tem sido referida pelos vários órgãos da CS como uma “receção violenta, com arremesso de pedras pelos manifestantes a André Ventura e comitiva, com um jornalista ferido, confrontos da polícia com manifestantes e um detido“. O comandante da PSP de Setúbal disse em entrevista à RTP, que o uso de força utilizado foi “proporcional” devido ao arremesso de pedras e fala mesmo no “objectivo da intervenção policial ter sido para limpar a rua“, dando a entender que foi uma manifestação violenta.

Antes de mais, estive desde o inicio na manifestação, pelo que digo com toda a convicção e franqueza que essa imagem que querem e fizeram passar nas tv’s não corresponde de todo, ao que tive oportunidade de testemunhar. Mais ou menos a meio da manifestação estava eu a mandar as imagens/videos aos meus camaradas do Semear o Futuro para serem partilhados no Facebook e como estava a chover com mais intensidade, fui abrigar-me debaixo dum edifício ao lado de onde a manifestação estava a decorrer. Pouco mais atrás de mim estava uma pessoa, um homem que eu já tinha visto no inicio da manifestação, mas apesar de não o ter ouvido nunca a gritar palavras de ordem, não dei importância, até porque pouco depois chegaram mais dois elementos ao pé desse homem, e pareciam estar na manifestação. Não pensei logo, até porque não sou de natureza “desconfiada”, em policias infiltrados à “paisana”, embora tal seja muito usual em manifestações.

Entretanto, acabei por ficar sem bateria no meu telemóvel, quando as palavras de ordem começam a intensificar-se novamente, pois estava a haver movimentação em termos de saída do interior cinema Charlot, onde o candidato fascista fez o seu discurso. Pelo que nesse momento voltei a aproximar-me da frente da manifestação (não no meio, mas um pouco mais desviado, não só para tentar ver melhor, mas também para ter algum distanciamento social). Pelo que tinha bastante visibilidade do que se estava a passar, quando Ventura sai do cinema e entra dentro do carro de onde seguiu. E a verdade é esta – não vi qualquer pedra a ser arremessada nem a Ventura nem ao carro. Nenhuma. É possivel que possa ter havido arremesso de algum, ou até mesmo alguns isqueiros? Sim é possível. A repórter da RTP falou igualmente em garrafas e rebuçados (que também sinceramente não vi). Vi sim que a saída e entrada no carro por parte de Ventura foi tão rápida, quanto a velocidade com que o carro arrancou assim que entrou no mesmo. Pelo que, o que quer que possa ter sido arremessado não terá nem de perto nem de longe sido a quantidade de objetos que a policia e Comunicação Social deram a entender.

É de realçar por último, que assim que o carro de Ventura arrancou, os manifestantes que estavam mais ao centro viraram-se para trás, com alguns deles a acorrerem à retaguarda. E no momento em que me aproximo para tentar perceber o que se passava, vejo que o primeiro homem que acima referia, à “paisana”, lançou gás pimenta diretamente à cara de um outro manifestante. E de imediato, é nesse momento que o corpo de intervenção da PSP que estava entre o cinema Charlot e as baias que separavam os manifestantes, carregam em força. Nesses curtos momentos, posso testemunhar que um manifestante foi agredido, inclusivamente no chão por pelo menos 4 agentes em simultâneo à bastonada, sendo depois levado de carro patrulha. E enquanto isso vários dos manifestantes, a maioria de etnia cigana, gritavam e diziam “é uma manifestação pacifica“, “vocês (policia) estão aqui para nos proteger“, até ouvi alguém dizer “não queremos nenhuma revolução“. E entretanto a policia de facto continuou a sua “limpeza” da rua, perseguindo durante alguns metros os manifestantes que estavam no centro da manifestação.

É no mínimo estranho o que aconteceu em Setúbal, pois o que vi e testemunhei em primeira mão, foi que a policia apenas carregou sobre nós já depois do carro que levava Ventura ter partido. Repito, não vi arremesso de qualquer pedra contra Ventura (muito menos uma “chuva” de pedras) nem contra ninguém, vi sim a Policia a usar força excessiva face aos acontecimentos que testemunhei e relato, que de forma alguma fazem sentido face à manifestação, que até aí tinha sido completamente pacifica.”

2 opiniões sobre “DesVentura em Setúbal: o que realmente aconteceu?

  1. Este artigo prova que não podemos confiar nos órgãos de comunicação social ou em certos testemunhos? Todas as TVs passaram notícias e imagens de apedrejamentos. Agora dizem que não houve pedras? Os jornalistas foram comprados? Ou este é mais um testemunho falso?

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