Normalmente não é boa estratégia perder tempo ou energias com candidatos que não disputam o mesmo eleitorado que a Marisa, candidata que o Semear o Futuro e eu apoiamos. No entanto, nestas eleições, dada a ameaça fascista protagonizada pelo André Ventura, está mais em jogo do que a normal disputa eleitoral. E, pelas mesmas razões, não irei obviamente atacar João Ferreira ou Ana Gomes, até porque me parecem candidatos bastante bons, nomeadamente o candidato do PCP, mas também em certa medida e noutro patamar qualitativo, a candidata Ana Gomes, tendo em conta o partido de onde vem e também pela perceção que as massas têm dela.
E ainda que, disputando o Mayan algum eleitorado com o André Ventura, seja algo perigoso criticá-lo, terei que referir que tudo o que irei dizer se aplica também ao André Ventura, que além do fascismo, racismo, xenofobia e machismo sempre presentes no seu discurso, também apresenta um programa altamente neoliberal, como podemos constatar nas suas propostas relativas à educação (venda das escolas aos professores) e saúde (referindo que o estado não deverá prestar esse tipo de serviços).
Porém, não poderei deixar de desmontar alguns dos argumentos que o Tiago Mayan dirimiu no primeiro debate conjunto das Presidenciais de 12 de Janeiro. Começo pelo típico elogio para depois chegar ao fatal “mas”:
O Tiago Mayan Gonçalves esteve excelente no seu debate contra o André Ventura. Demonstrou como um liberal pode sê-lo sem ser conivente com o fascismo e sem incorrer em todas as falácias presentes no discurso fascista que o líder do Chega profere a cada intervenção que tem. Desmontou, primeiro e a meu ver de forma mais eficaz que os candidatos de esquerda, nomeadamente por vir de um candidato também de direita, o discurso ciganofóbico de André Ventura. Ao mesmo tempo dá uma potencial facada interna no Chega, pois duvido que aquela distrital do Porto (ligada aos Super Dragões – claque do Futebol Clube do Porto) goste muito da proteção por omissão que o líder do Chega dá a Luís Filipe Vieira, presidente do Benfica. Disse ele, e muito bem, que os RSI atribuídos anualmente a famílias ciganas não chegam a uma migalha do que o presidente do Benfica deve ao BES/Novo Banco e que provavelmente seremos nós a pagar.
Mas..
Não nos podemos esquecer do apoio “inestimável” que o governo facínora do Pinochet teve dos neoliberais da escola de Chicago e que transformou o Chile no laboratório das suas políticas no mundo a custo de muitos mortos e da precarização de uma grande parte da população que, perante uma ditadura sanguinária, não podia reagir aos constantes ataques perpetrados contra os seus direitos laborais e sociais. Todas essas políticas que ainda subsistem provocaram os levantes do ano passado protagonizados por um povo cansado de ser tratado como mais uma mercadoria presente na cadeia de valor.
E é isto que Mayan propõe: usar a mão de obra como uma qualquer mercadoria que se pode usar e descartar conforme a necessidade do momento ou até motivado por outras razões mais obscuras, como por exemplo os efeitos que despedimentos em massa têm, paradoxalmente, na evolução do valor das ações duma empresa. Pois é sabido que, perante um despedimento em massa numa empresa cotada em bolsa, em vez das suas ações baixarem, por poder refletir uma diminuição de produção ou problemas financeiros, este acaba normalmente por originar uma subida, por supostamente demonstrar aos acionistas o esforço da administração para atingir uma maior eficiência, já que se pretende produzir mais ou o mesmo com menos trabalhadores… Já sabemos que quem vai pagar a fatura serão, além dos trabalhadores despedidos, também os que ficam a trabalhar o dobro.
E Mayan não deixa de ter razão quando diz que é normal que, em competição com países com regimes laborais que protejam mais o emprego e salários (mesmo que apenas timidamente), os países que adotem medidas mais liberais e com menor proteção laboral tenham melhores resultados no curto prazo a nível dos indicadores macroeconómicos. Claro que, apesar de serem referência absoluta um pouco por todo o mundo, estes indicadores pouco refletem as condições reais em que vivem as camadas mais pobres da população. Mas, claro, Tiago Mayan fala do mundo que conhece – A alta finança – e não do mundo real que não conhece, nem nunca conhecerá.
E também é normal, por outro lado, que possa haver alguma transferência de capitais e de empresas dos países menos liberais, isto é, com menor carga fiscal e direitos sociais, para os mais liberais pois, como sabemos, quando o dinheiro chama, os capitalistas esquecem-se das questões nacionais que são apenas uma bandeira que agitam em momentos eleitorais, quando fingem que os seus interesses são os mesmos que os da classes operárias do seu país. Algo que, ainda assim, teve recentemente um exemplo em sentido contrário no Brasil, em que a Ford, apesar das medidas ultraliberais promovidas pelo governo Bolsonaro, preferiu manter a produção na Argentina, com um governo centro-esquerda, e fechar no Brasil em cidades como Taubaté, que deu 81% dos seus votos a Bolsonaro no 2º turno das últimas eleições presidenciais.

Todos sabemos que o capitalismo é um jogo em que uns ganham e outros perdem. E sabemos também que é um jogo viciado, em que os países que nele entraram numa posição de vantagem colonial ainda são hoje os que mais ganham e os que partiram numa posição de subserviência, salvo raras exceções, ainda são os que sempre ou quase sempre perdem. Logo, perante uma situação hipotética defendida por Mayan, em que todos os países duma certa região ou grupo económico (com características semelhantes e que, por isso, compitam entre si) adotarem as medidas liberais que este defende, bastará que um deles as abandone para tudo ruir. Pegando no exemplo da saúde e no modelo defendido por Mayan – público, privado e social em competição, sendo o cidadão, financiado pelo estado (ou seja impostos) a escolher o seu prestador – que consequências teria nos outros países se um deles, ao pretender reduzir ainda mais a carga fiscal, retirar esses apoios que supostamente permitiriam acesso universal à saúde? Das duas uma: ou mantinham esse sistema e perderiam as empresas que se deslocariam para o país que tinha baixado a carga fiscal ou embarcariam na mesma aventura de continuar competitivos à custa da saúde da população, permitindo que, numa situação como a atual, víssemos uma desgraça ainda pior ocorrer, como podemos constatar nos EUA, o país mais rico do mundo de acordo com os tais indicadores macroeconómicos, mas que mantém cerca de 40 Milhões de pessoas (cerca de 13% da população) a viver abaixo do nível de pobreza.
É por isso e muitos exemplos semelhantes que ouvir Mayan, quando não está a discutir com o André Ventura, me deixa de cabelos em pé, assustado pelo efeito de “canto da sereia” que este discurso está a provocar.
A nossa vida não é um jogo em que para uns ganharem outros têm que perder. O capitalismo está obsoleto há anos e precisamos de um novo sistema que coloque o bem estar das pessoas à frente e não esperar que, miraculosamente, o constante enriquecimento das classes mais favorecidas venha beneficiar as mais desfavorecidas através duma mão que é invisível pelo simples facto de não existir.
E a única candidatura que tem resposta para todos estes ataques à população, sejam estes desferidos por André Ventura, por Tiago Mayan, pelo governo ou pela inação de Marcelo Rebelo de Sousa, é a de Marisa Matias.
É a candidata que coloca as questões a nível internacional na agenda numa perspetiva de cooperação e não de competição constante.
É a candidata que pretende usar o cargo de Presidente da República, com apoio da Constituição, para impor aos governos o cumprimento dos direitos mais progressistas que lá estão plasmados e impedir toda e qualquer medida que ataque direitos fundamentais.
É a candidata que vê nos grupos oprimidos e na questão da justiça climática o futuro da luta de classes e que se coloca, sem qualquer hesitação, do lado certo da história.
É a candidata que conhece o mundo real pois, antes de entrar para a política, já tinha trabalhado em empregos altamente desgastantes enquanto estudava com resultados académicos brilhantes.
É por isso que a Marisa tem o meu apoio incondicional!
Vota Marisa Matias #marisa2021 #vermelhoembelem
One thought on “Tiago Mayan Gonçalves – O neoliberal utópico”