O assassinato de Bruno Candé não vai passar em branco!

Os negros , as negras, os ciganos , as ciganas, os e as imigrantes, bem como toda a população antirracista de Portugal entrou em luto no passado sábado, dia 27, ao saber que 4 dos 6 tiros  disparados por um homem racista contra Bruno Candé o mataram.

Eu me poderia centrar nas inúmeras qualidades do Bruno, porque ele as tinha, mas há algumas considerações a ser feitas sobre a conjuntura que lhe ceifou a vida e sobre um estado e governo que continuam a negar o racismo vigente na sociedade portuguesa.

Há uma mensagem muito clara quando um estado, através da intervenção da polícia, brutaliza, espanca e assassina pessoas racializadas. Há uma mensagem muito clara quando um estado cria leis de ordenação de território que provocam a demolição das casas de pessoas racializadas e periféricas. Há uma mensagem muito clara quando um estado permite que organizações de índole fascista e neofascista como o Movimento Zero se apropriem de instituições públicas militares como a PSP e a GNR. Há uma mensagem bem clara quando um estado não faz cumprir a sua constituição no que há de mais progressivo nela permitindo que um deputado racista , xenófobo e neofascista seja eleito e ocupe lugar na casa da democracia portuguesa. Há uma mensagem muito clara quando o Mário Machado, condenado por ter cometido crime de ódio racial contra Alcindo Monteiro, matando-o, seja convidado para falar em horário nobre sem que haja indignação. Há uma mensagem clara quando o governo do PS se solidariza com um incêndio num canil mas nada diz sobre o assassinato do Bruno em Moscavide em pleno dia.

Esta mensagem clara e branca transmitida por um racismo institucionalizado, a mensagem de que os corpos negros não valem nada, foi percebida, digerida e executou de forma premeditada o Bruno pelas mãos de um assassino ex-combatente da guerra colonial, que mais não foi do que uma guerra racista de dominação de territórios Africanos cuja principal função era matar pessoas negras nesses mesmos territórios por quererem liberdade. Esse crime não foi só premeditado na individualidade do assassino cujo nome a justiça preza em manter em sigilo; foi premeditado durante 59 anos, desde o início da guerra do ultramar, e teve por cúmplice todos os governos portugueses que nunca tiveram intenção de levar a cabo nenhum plano antirracista de governação. Bem pensado, teve por cúmplice 600 anos de história. Tem por cúmplice não só a seletividade da PSP nos seus interrogatórios, quando escolhe a dedo testemunhas que alegam não haver motivação racial num crime que foi precedido por “Fui à tua mãe e àquelas pretas de merda todas”  – para os mais ingénuos, fica a explicação de ser uma alusão a hábitos dos soldados portugueses que, entre uma decapitação ou outra, violavam mulheres e crianças na guerra do Ultramar. Outras frases proferidas pelo então relatado como “só um idoso num momento de fúria”  foi “ Volta para a senzala” e “Preto do caralho, volta para a tua terra.”. Mas esse cariz premeditado não está só na seletividade da PSP nem nas palavras do homicida, está também na conivência de uma PJ que não recolheu os projéteis na cena do crime e que deixou essa tarefa para a família da vítima.

Mas há esperança ainda, a esperança dessa terra cumprir o seu ideal de sociedade que se guia por valores como a igualdade entre todas as pessoas, independentemente da etnia, género, sexo, idade, sexualidade e origem.

O Movimento de negros e negras , bem como quem tem compromisso com a luta antirracista não deixará que actos como estes caiam no esquecimento e por isso chama todos, todas e todxs a estar amanhã, dia 31/07/2020, no Largo de S. Domingos pelas 18h na manifestação[1]O racismo matou de novo: Justiça por Bruno Candé. Os colectivos anti racistas chamam todos, todas e todxs o que são da esquerda, das lutas feministas, climáticas , sindicais e todos os que lutam por igualdade social e direitos democráticos a tomar as ruas para exigir justiça para Bruno Candé e medidas concretas contra o racismo.


[1] Outras manifestações vão acontecer em Coimbra e Beja no dia 31/07 e em Braga, Évora, Guimarães, Porto, Faro e Viseu no dia 01/08.

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